Na quase totalidade das rodovias brasileiras, a circulação de veículos convive com a circulação de pedestres e de ciclistas, problema que se agrava na proximidade dos centros urbanos e nas rodovias litorâneas. Em alguns casos jamais será possível segregá-las, pois as estradas se converteram em verdadeiras avenidas. Em outros casos será possível construir pistas marginais para o tráfego local ou separar o sistema rodoviário do sistema viário urbano.
Uma forma de atingir este último objetivo tem sido a construção de vias de contorno aos centros urbanos, solução essa condenada por alguns urbanistas sob o argumento de que, anos após, seria preciso fazer outro contorno. Outro caminho, muitas vezes viável, é o de rebaixar a rodovia nos centros urbanos, deixando no plano superior as ligações necessárias da malha urbana.
São sempre soluções onerosas, mas que se impõe como forma de reduzir acidentes e de restaurar a capacidade da rodovia. Quem circular pelos primeiros 50 km da Rodovia Raposo Tavares verá quão difícil é manter uma razoável capacidade de tráfego, ainda que duplicando a estrada, se não forem resolvidos os conflitos com a vida urbana em diversas localidades.
Uma das vítimas mais freqüentes desses conflitos é o transeunte, que nem sempre conta até mesmo com um acostamento para percorrer e que, a todo instante, se vê na contingência de atravessar o fluxo de tráfego em dois sentidos, enfrentando ainda o obstáculo central de uma barreira ou defensa aplicados em espaço exíguo. Agrava-se ainda esse quadro quando o transeunte traz consigo crianças ou porta volumes, carrinho de mão ou de feira e, às vezes, longas peças de madeira ou de encanamentos. E não estou aqui teatralizando alguma situação do interior do Nordeste, mas referindo travessias que ocorrem na Via Dutra, na Via dos Bandeirantes, na Via dos Imigrantes e, fartamente nas rodovias Raposo Tavares e Manoel da Nóbrega.
A par das medidas de reforma das estradas, visando segregar o tráfego de veículos daquele de pedestres e de ciclistas, é preciso ampliar, desde já, a proteção a estes últimos. Proteção que, afinal, beneficia também os condutores e passageiros dos veículos.
Um caminho, para as travessias, é construir passagens em desnível. O recurso à implantação de uma passagem inferior tem limitações, seja porque normalmente é uma obra cara, seja porque as pessoas têm medo de serem assaltadas. Mas em alguns casos especiais, como foi feito anos atrás em Bocaina, a solução é simples: se a estrada corta a cidade em aterro, não é difícil e nem excessivamente caro fazer uma passagem, talvez pré-moldada, por baixo.
Contudo, a solução mais corriqueira é a passarela, que pode ser moldada in loco, construída de perfis metálicos ou montada em concreto pré-moldado.
Vários cuidados são necessários:
As colunas de acessos das passarelas devem ser protegidas por defensas ou barreiras, que evitem colisões por veículos desgovernados.
Quanto ao método construtivo, a melhor solução seria sempre a que utilize elementos pré-fabricados, cuja colocação na estrada se faz com rapidez. Até hoje não se viabilizou uma produção seriada de estruturas metálicas que pudesse ser relativamente leve e de fácil montagem e econômica, como vem ocorrendo com os pórticos.
O problema da travessia de pedestres nas rodovias é de tal forma grave, que se justificaria um verdadeiro programa intensivo de implantação de passarelas, como o governo de São Paulo fez, em 1985/96, na Baixada Santista e que vem sendo prosseguido, embora lentamente. O custo de uma passarela não é algo insuportável para qualquer administração rodoviária; mas é preciso estudar soluções mais econômicas.
Outro caminho para reduzir dispêndios com passarelas, em benefício da segurança nas estradas, é associá-las a mensagens publicitárias. Nas rodovias de elevado tráfego, os agentes publicitários certamente se interessarão por expor mensagens institucionais (propaganda simples, sem dizeres, apenas com logomarcas) que pagariam com folga o valor de uma passarela. O cuidado será não “esconder” o transeunte atrás das placas, mas localizá-las somente na altura das vigas; ou fazer a mensagem em painéis transparentes.
Uma outra idéia é associar os dispositivos de mensagens variáveis às passarelas, quando possível, dando dupla utilidade à passarela. Ou até mesmo construir pórticos-passarelas. Na rodovia Pe. Manuel da Nóbrega, por exemplo, onde quer que se construa uma passarela, haverá um transeunte interessado nela; por que, então, não associar todos os pórticos a passarelas?
Estão feitas aqui algumas provocações. A grande verdade é que a implantação de passarelas tem sido relegada a plano secundário, entre nós, entre outras razões devido ao argumento de que pessoas não as utilizam. É claro que se necessita educar e punir os transgressores; dificultar-lhes, também, a travessia pela pista. Mas há de se notar que aqueles que mais necessitam da passarela, devido a condições físicas ou à idade, justamente as que correm maior risco, são os que mais a utilizam.
Um filme feito na Raposo Tavares, no ano de 85 ou 86, mostrava uma senhora que, com seu vira-latas ao lado, tentava atravessar a pista junto a uma passarela. Em dado momento, o cachorro desistiu da aventura e valeu-se da passarela; a senhora continuou esperando a oportunidade entre os carros...