• Pesquisar:

Menu superior







Mapa da violência 2013: Extratos

(pág. 6) No Brasil, no ano de 2011, 66,6% dois terços das vítimas no trânsito foram pedestres, ciclistas e/ou motociclistas,

mas as tendências nacionais da última década estão apontando uma evolução marcadamente diferencial à do resto do mundo:

  • Quedas significativas na mortalidade de pedestres;
  • Leve aumento da mortalidade de ocupantes de automóveis e
  • Pesados aumentos na letalidade de motociclistas.

Como teremos oportunidade de ver ao longo dos capítulos a seguir, as motocicletas transformaram-se no ponto focal e causa explicativa do crescimento da nossa mortalidade cotidiana nas vias públicas.

(pág. 9) Mortes evitáveis

Acompanhando as tendências internacionais vigentes desde a década de 1970, o Ministério da Saúde do Brasil vem operacionalizando o conceito de mortes evitáveis. Segundo conceitua o Ministério, são aquelas cuja evitabilidade é dependente de tecnologia disponível no Brasil, de tecnologia acessível pela maior parte da população brasileira ou de tecnologia ofertada pelo Sistema Único de Saúde. Nessa categoria de evitabilidade, encontram-se incluídas as mortes nos acidentes de trânsito que, no entendimento do próprio Ministério, podem ser reduzidas por ações adequadas de promoção à saúde, vinculadas a ações adequadas de atenção à saúde.

Assim, considerando especificamente os acidentes de trânsito, o Ministério da Saúde os inclui entre os evitáveis por ações intersetoriais adequadas, isto é, vidas que poderiam ser salvas nas atuais condições da infraestrutura social e institucional do país.

(pág. 10) Visão zero

Esse entendimento da evitabilidade das mortes no trânsito nos leva, necessariamente, a compartilhar a visão zero, estratégia aprovada pelo parlamento sueco em 1997 e adotada pelos países da União Europeia.

Fundamenta-se no princípio que nunca pode ser eticamente aceitável que alguém morra ou fique gravemente ferido enquanto se desloca pelo sistema rodoviário de transporte . Dentro dessa ótica, zero não é um número a ser alcançado em uma data específica, mas uma visão da segurança do sistema que ajuda na construção de estratégias e no estabelecimento de metas. Contraria a visão atualmente imperante na maior parte dos países do mundo, na legislação, nas estruturas de fiscalização, nas pesquisas, na mídia, que focam a atenção, de forma quase exclusiva, na culpa dos usuários. Na visão zero, se estabelece que a responsabilidade seja partilhada entre os planejadores/gestores e os usuários. Assim, não é suficiente definir legalmente como os motoristas devem dirigir ou se comportar no trânsito e o que é passível de sanção, é preciso que o desenho das vias e a gestão da mobilidade facilitem e contribuam com as condutas seguras pelos usuários.

(pág. 11) Tolerância institucional

.... Concomitante com o crescimento da mortalidade no trânsito do país, vai se aprofundando a tendência institucional de responsabilizar, de forma quase exclusiva, os usuários das vias públicas, num claro processo de inversão de responsabilidades e causalidade: as vítimas dos acidentes são transformadas em culpáveis de sua própria morte.

Dessa forma, determinados níveis de violência são tolerados e até esperados e aceitos pelas instituições que deveriam zelar pela segurança nas vias públicas. As mortes são fácil e rapidamente incluídas na categoria de eventos inevitáveis, resultados da fatalidade ou da imprudência, imperícia ou desrespeito às normas por parte dos usuários: pedestres, condutores ou passageiros.

(pág. 25) (Evolução por categoria de acidente)

Se excluíssemos os motociclistas dos cálculos, veríamos que, entre 1996 e 2010, o número de mortes no trânsito cairia de 33,9 mil para 27,5 mil, uma diminuição de 18,7% no período, ao invés de aumentar 22,6%. As taxas cairiam mais ainda: de 21,6 óbitos, para por 100 mil habitantes em 1996, para 14,4 em 2011, uma queda bastante significativa: 33%, ao invés de permanecer estagnada em 25,5 óbitos por 100 mil habitantes. Assim, na atualidade, as motocicletas constituem o fator impulsor de nossa violência cotidiana nas ruas, fato que deve ser enfrentado com medidas e estratégias adequadas à magnitude do problema.

(pág. 26) (Frota veicular e mortalidade no trânsito)

...... Podemos observar, em primeiro lugar, a crescente importância que vem adquirindo a motocicleta no contexto veicular do país. Além disso, o uso maciço da motocicleta como meio de transporte é um fenômeno relativamente recente. Segundo o próprio Denatran, em 1970 era um item de baixa representatividade: num parque total de 2,6 milhões de veículos, só havia registradas 62.459 motocicletas: 2,4% do parque total.

Na virada do século, no ano 2000, temos 4,0 milhões de motocicletas registradas, o que já representa 13,6% do parque veicular. Para 2011, o número pula para 18,4 milhões, representando 26,1% do total nacional de veículos registrados pelo Denatran.

......

O que realmente impressiona é o ritmo de crescimento do número de motocicletas. Na virada do século, esse ritmo foi em torno de 20% ao ano, ultrapassando bastante o propalado crescimento dos automóveis. Se, entre 1998 e 2011 a frota de motocicletas cresceu 610%, ou seja, cresceu sete vezes no período, a de automóveis cresceu 134%, pouco mais que duplicando seu número, ...

Mantendo-se o ritmo atual, uma simples previsão linear permite verificar que, no ano de 2024, as motocicletas registradas ultrapassarão os automóveis. ....

O forte crescimento do número de motocicletas nos últimos anos ... poderia ser motivo de comemoração, não fosse um dado altamente inquietante: o exponencial crescimento da mortalidade nos acidentes de motocicleta.......

Se a frota de motocicletas cresceu 491% no período, as mortes de motociclistas cresceram 610%. Em outras palavras: 491% do incremento da mortalidade devem-se ao aumento drástico da frota de motocicletas; o restante: 119% (a diferença entre ambas as percentagens) só pode ser interpretado como um aumento do risco motocicleta no trânsito, isto é, maior risco de morte de motociclistas no trânsito.

(pág. 61) (Internações hospitalares por acidentes de trânsito)

.......A despeito do aumento de 46,3% no total de internações, todas as categorias de acidentados no trânsito caíram no período, salvo as internações de motociclistas. O aumento no número de internações de motociclistas foi de tal magnitude que superou o peso das quedas de todas as demais categorias. Por esse motivo, o saldo global do período foi um aumento de 46,3% no número e de 22,0% nas taxas de internação.

Para melhor entender a incidência dessas internações: se excluirmos do cômputo os motociclistas, teríamos uma queda de 21,2% no número de internações no país entre 1998 e 2012.

......evolução das três categorias de maior volume de internações: pedestres, cujas taxas caem 32,8%; ocupantes de automóvel, com quedas de 33,4% e ocupantes de motocicleta, cujas taxas aumentam drasticamente: 288,7%.

Com crescimento contínuo a partir de 1998, com um ritmo de perto de 10% ao ano, as taxas de internação de motociclistas experimentam um brusco incremento a partir de 2009, quando pulam para 30% ao ano.

(pág. 91) (Motorização privada)

...... O gráfico a seguir é bastante claro: de perdurar as atuais circunstâncias, uma simples análise de tendência está a indicar que as mortes dos motociclistas em acidentes de trânsito terá um íngreme crescimento nos próximos anos. A taxa de 2011, que era de 7,6 mortes de motociclistas por 100 mil habitantes, deverá passar para 12,0 no ano 2020. Isso significa que, em 2020 deverão morrer acima de 25,5 mil motociclistas numa combinação inaceitável de desrespeito a vida humana e submissão institucional aos interesses de grandes conglomerados em função dos lucros derivados da progressiva motorização da população. As famosas leis de mercado‖. Que significa isso? Na presente década, de 2011 a 2020 deverão morrer 196,2 mil motociclistas. Será um número suficiente para provocar alguma reação institucional?

MV 2013 grafico 11 R1

(pág. 92) (Tolerância institucional)

Uma das primeiras questões para explicar que surgem para explicar o íngreme crescimento é o da responsabilidade – ou ausência de responsabilidade - das instituições encarregadas, direta ou indiretamente, da gestão das questões relacionadas com trânsito, tópico já iniciado no capítulo 1. Apontavamos que, acompanhando as tendências internacionais, o Ministério da Saúde do Brasil vem adotando o conceito de mortalidade evitável ou reduzível nas mortes no trânsito, nas atuais condições do país.

Também mostramos as potencialidades da visão zero que propondo que a responsabilidade pelos acidentes e a mortalidade no trânsito deve ser partilhada entre planejadores/gestores e usuários.

O ordenamento legal brasileiro vai além. Segundo o último Código de Trânsito Brasileiro, já desde seu Capítulo I: Disposições Preliminares estabelece:

§ 2º O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.

§ 3º Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.

§ 5º Os órgãos e entidades de trânsito pertencentes ao Sistema Nacional de Trânsito darão prioridade em suas ações à defesa da vida, nela incluída a preservação da saúde e do meio-ambiente.

E quando define, no Capítulo II, o Sistema Nacional de Trânsito, estabelece:

Art. 5º O Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades. (sublinhados nossos)

Se assim fica estabelecido na letra da lei, na prática cotidiana vai se consolidando a tendência inversa: a de responsabilizar, de forma quase exclusiva, os usuários das vias públicas, num claro processo de inversão das responsabilidades que a lei estabelece. São indicadores dessa inversão:

  • Prevalência nas pesquisas institucionais dos diversos aspectos centrados nos usuários: alcoolemia ou cansaço na condução, deficiências no uso de equipamentos de segurança – cinto de segurança, capacete - desrespeito ás normas do trânsito, velocidade excessiva, cansaço, condução perigosa, etc.
  • Sumiço quase absoluto de estatísticas sobre acidentes de trânsito, principalmente, nos respectivos sites na internet dos organismos responsáveis pela sua coleta e divulgação (leia-se Denatran, Polícia Rodoviária Federal, etc.).

Apesar de avanços recentes na formulação de mecanismos de enfrentamento, principalmente na legislação – regulamentação e profissões que usam motocicletas, endurecimento das penalidades e da fiscalização da alcoolemia, processo de municipalização da gestão, etc – escassos são os resultados que podemos observar nos números: continuam aumentando. Sem por dúvida a eficiências dessas medidas, fica claro que são ainda insuficientes. Os números são claros nesse sentido.

Inclusive propostas largamente debatidas, como as que constam no Plano Nacional De Segurança no Trânsito Para a Década 2011-2020, formulado pelo Comité Nacional de Mobilização pela Saúde, Segurança e Paz no Transito do Governo Federal, para o primeiro ano de vigência do mesmo, isto é 2011 não parecem ter saído do papel. È o caso do Observatório Nacional do Trânsito, o Sistema Integrado de Informações de Trânsito, e tantos outros.

palavras-chave: mapa, violência, acidente, trânsito, motocicleta