Texto publicado no portal do DENATRAN, em 2002, por ocasião da Semana Nacional do Trânsito
Os estudos sobre as conseqüências do uso do aparelho celular no trânsito ainda são bastante incomuns, porém já determinam que este uso aumenta em quatro vezes o risco do condutor sofrer acidentes, como é apresentado no estudo realizado no Canadá.
A pesquisa, que durou 14 meses, foi realizada com 699 motoristas que tinham telefones celulares e foram responsáveis por acidentes com perdas materiais relativamente graves, porém sem acidentes pessoais. O resultado demonstrou que o número de acidentes acontecidos durante ou imediatamente após uma conversa ao telefone foi mais de quatro vezes maior do que o esperado na direção normal de veículos, bem como, motoristas mais jovens têm maior tendência a problemas, nessa situação, do que os mais velhos.
Foi comprovado, também, que os condutores utilizando-se de aparelho de viva -voz, correm o mesmo risco de sofrer acidentes do que aqueles que seguram o aparelho enquanto dirigem. A questão perpassa pela limitação sobre o que você pode fazer com seu cérebro, ou seja, alterações de atenção, controle das emoções, raciocínio, entre outras reações que são percebidas quando falamos ao telefone. Esta visão contraria a suposição de que o viva-voz não interferiria na direção por não necessitar de esforço motor.
A conversação no telefone é bem diferente que a realizada com o passageiro, pois este funciona até mesmo como um auxílio para percepção de algumas situações na via. O passageiro coopera com o condutor mostrando melhores saídas, apontando algum desleixo do condutor, chamando atenção para perigos que possam surgir, já que a própria vida está condicionada a uma boa direção. A pessoa externa que conversa com o condutor através do aparelho celular não sabe o que está acontecendo no trânsito, transmite uma série de emoções e sentimentos que podem prejudicar a condução. Neste momento, o condutor desliga o celular e fica idealizando tudo o que conversou, sem ter ninguém para lhe confortar, podendo causar acidente até após desligar o telefone como reação do que acabou de saber. Pensemos, por exemplo, numa conversa onde o condutor fica sabendo que sua mãe está muito doente. Ele corre em disparada para atendê-la. Daí ele infrige o sinal vermelho, dirige em alta velocidade, não observa as placas de sinalização, entre outras situações de risco. Se a notícia fosse dada por um passageiro, por exemplo, este confortaria o condutor através de uma conversa sensata e apontaria para os erros cometidos no trânsito, que afetaria duas vidas além do desfalecimento da mãe.
O estudo apresentado pelo Prof. José Aparecido da Silva considera análises epidemiológicas, apontado que o uso do aparelho celular aumenta o risco dos motoristas se envolverem em colisões de trânsito. Neste contexto, foram somadas as relações, entre a quantidade de tempo dispensada mensalmente no celular e os diferentes fatores que distraem a atenção dos motoristas, cuidadosamente examinadas através de análises de cruzamentos de casos e de técnicas de regressão logística. Utilizou-se mais de 200.000 acidentes de trânsito compreendendo o período de 1992 a 1995. Ao acrescentarmos o uso do celular com as variáveis, como idade, sexo, uso de álcool, velocidade, distratores e dirigindo à esquerda do centro da pista, as análises mostraram que o risco de se envolver em colisões fatais foi aproximadamente nove vezes maior. Quando apenas a variável uso do telefone celular foi considerada, este risco dobrou.
Como resultado, os dados epidemiológicos não revelam nenhuma vantagem em termos de segurança no trânsito entre o uso de aparelhos viva-voz e aparelhos manuais.
A Associação Brasileira de Medicina de Tráfego-ABRAMET considera no seu estudo fatores operacionais destacando o ato de pegar o telefone no bolso ou em qualquer lugar como já prejudicial no desvio da atenção do motorista no trânsito. Os fatores motores, já representam um risco no uso do aparelho celular, acrescentam-se mais recentemente, inclusive neste estudo, os fatores psicológicos e cognitivos dispensados neste uso, já reconhecendo o desvio de atenção na utilização do aparelho viva- voz.
Ação do motorista
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Tempo gasto(estimado)
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Distância percorrida 100 km/h
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Acender um cigarro
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3 segundos
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80 metros
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Beber um copo d´água
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4 segundos
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110 metros
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Sintonizar o rádio
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4 segundos
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110 metros
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Procurar objeto na carteira
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Mais de 3 segundos
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Mais de 80 metros
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Consultar um mapa
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Mais de 4 segundos
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Mais de 110 metros
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Discar número de telefone
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5 segundos
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140 metros
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Fonte: Volkswagen
Como podemos perceber neste quadro, entre todas as ações, a discagem do número, requer maior tempo, afetando na distração do condutor. O ritual começa desde a procura do aparelho até depois da conversa. Dependendo do assunto tratado na mesma, o condutor pode ter várias reações que irão refletir na segurança e responsabilidade da direção.
Entre as reações comportamentais possíveis e previsíveis relacionadas ao uso do celular pelo condutor do veículo no trânsito, podemos destacar a descarga emocional que acompanha o conteúdo do assunto explorado no momento da conversa como, por exemplo, o choro, a agressividade, o aumento da irritação e da tensão interna, a euforia e o entusiasmo. Algumas dessas descargas podem vir somadas ao fator espontâneo e alheio à vontade do condutor, desde que sejam advindas do Sistema Nervoso Autônomo, levando-o a atitudes impulsivas.
A sensação de impotência, frente ao desconhecimento da notícia recebida através do aparelho celular, pode evocar no condutor um quadro de extrema angústia perante a impossibilidade de tomada de decisão momentânea.
Aliados às reações supra citadas têm-se o nível de stress do dia-a-dia no tráfego, na vida pessoal e no trabalho do condutor que podem intensificar o risco de acidente no trânsito.
Apesar da existência de poucos estudos sobre o uso do aparelho celular, os que já foram realizados alertam para o risco por ele causado, ressaltando não somente o abandono de uma das mãos, que influi na limitação motora do condutor, mas também pela perda de atenção no trânsito.
Alguns países têm restringido o uso do aparelho celular no trânsito visando a direção com segurança, cuidadosa e hábil, não tendo nenhuma ferramenta que desvie a atenção do condutor e permita a execução de manobras que não ocasionem colisões. Por exemplo, Austrália, Espanha, Portugal, Itália, Chile, Suíça, Israel, Grã-Bretanha, Dinamarca, Polônia, Hong Kong e o Brasil, têm elaborado normas ou leis proibindo o uso de celulares no trânsito.
Nos EUA, a polícia acredita que 30% das batidas são causadas por distrações dos motoristas que incluem dispositivos de comunicação móveis.Na Inglaterra, o governo está quase aprovando uma lei para banir a utilização do celular no trânsito, sem fone ou viva-voz. A Suíça e a Argentina, que ainda permitem o uso do aparelho de viva-voz, já estão pensando em proibi-lo. No caso do primeiro, é conseqüência da lei britânica que também está sendo debatida em outros países da Europa, no caso do segundo, a questão é que a legislação não menciona o aparelho viva-voz, por se tratar de tecnologia mais recente.
Em dólar
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Nova York
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100
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Cingapura
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600
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Israel
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150
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Espanha
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100
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Japão
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90
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Suíça
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70
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Brasil
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35
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França
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22
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Regras pelo Mundo
França
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Proibido falar ao celular com carro em movimento. Pode ser usado se parar. Multa de R$ 66. Valor dobra ou triplica se pago em três dias. São 3 pontos na carteira.
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Suíça
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Permite viva-voz, mas pode rever essa autorização. Multa por usar celular na mão é de R$ 200.
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Inglaterra
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Governo deve aprovar lei para banir celular, fone ou viva-voz ao volante.
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Argentina
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É proibido o uso do aparelho ao dirigir, mas não há menção sobre o viva-voz. Multa de R$ 289 a R$ 1.445.
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Fontes:
- Celular e Direção Veicular - Associação Brasileira de Medicina de Tráfego
- A opinião pública sobre o uso de celular na direção e perfil do usuário - PUC/PR e DETRAN/PR
- Telefones Celulares e os acidentes de trânsito - Prof. José Aparecido da Silva (USP)
- "Na Argentina, lei tem brechas"- O Estado de São Paulo - 30/08/02
- "Multa mínima de R$ na França"- O Estado de São Paulo - 30/08/02
- "Inglaterra e Suíça também querem banir o aparelho" - O Estado de São Paulo - 30/08/02