Articulados, esforços da sociedade civil rendem melhores resultados
ONGs brasileiras discutiram “advocacy” para a segurança viária em encontro promovido pela Opas em Brasília. Organismos internacionais apoiam iniciativas.
(Complemento do artigo Juntos em defesa da paz no trânsito.)
Marina Lemle
Uma ou duas ONGs, trabalhando isoladamente, têm pouca chance de fazer uma diferença mensurável. Mas um número maior de ONGs, trabalhando articuladas, obtém, proporcionalmente, maior impacto, segundo evidências reunidas pelo Global Road Safety Partnership (GRSP). A informação é de Gayle Di Pietro, coordenadora do programa Road Safety in 10 Countries (RS10), da GRSP, que veio a Brasília para participar do “Seminário nacional sobre advocacy para ONGs com foco em segurança no trânsito”, realizado em 12 e 13 de agosto de 2013.
Promovido pela Opas – Organização Pan-Americana da Saúde, o encontro reuniu representantes de cerca de 20 ONGs brasileiras, de associações de vítimas a organizações que trabalham temas específicos na área de trânsito, como pedestres, ciclistas e transporte sustentável.
Em sua apresentação, Gayle (foto) definiu o termo advocacycomo “ação organizada dirigida para influenciar tomadores de decisão e formadores de opinião para mudar políticas, estruturas e sistemas com o objetivo de apoiar comunidades vulneráveis”.
De acordo com a especialista, quando ONGs que desenvolvem trabalhos similares na mesma área formam coalizões, consórcios, parcerias ou mesmo associações informais, o impacto é melhor. Ela pondera, entretanto, que é preciso muito cuidado ao se fazer parcerias:
“Os valores, a ética e o foco devem ser similares ou a organização deve enxergar no possível parceiro algo que possa suprir uma lacuna da sua. Ou seja, não devem estar em pólos opostos mas também não devem ser uma réplica uma da outra.”
Gayle chamou atenção para as devidas distinções entre ações de advocacy, educação, campanhas e seus métodos, meios, focos e objetivos. Ela ressaltou o papel das ONGs de persuadir políticos e gestores e a importância de se usar recursos de advocacy, e não de lobby, para atingir os objetivos.
Para ela, é importante ter uma visão global: “Às vezes a paixão invade o caminho da escuta. É fácil ter uma visão da terra e não ver através. Aí é melhor dar um passo atrás e buscar uma ‘vista de helicóptero’, que mostre o que realmente está acontecendo, para que se possa mapear cada oportunidade de fazer a diferença.”
Apoio internacional
Gayle deu instruções de como enviar boas propostas para concorrer aos fundos oferecidos pela Bloomberg Philanthropies, como o programa de bolsas para ONGs, sob gestão da GRSP, que busca propostas de mudanças de políticas e de ações que reduzam a morbimortalidade no trânsito. As ONGs selecionadas a cada seis meses recebem cerca de R$ 10 mil por mês durante dois anos para desenvolver seus projetos. Ela recomendou que as concorrentes sejam claras sobre o que estão fazendo e anunciou a realização de uma oficina de capacitação no Brasil na primeira semana de dezembro de 2013, com apoio da Opas/Brasil.
A diretora de Comunicação da Organização Mundial de Saúde (OMS) em Genebra Laura Sminkey (foto) também trouxe em sua apresentação uma definição da missão do advocacy: aumentar a sensibilização sobre um problema com a finalidade de influenciar políticas, programas e recursos dedicados a ele.
“É muito importante para as ONGs que usem seu poder de advocacy para levar adiante questões de segurança viária, pedir melhor legislação, forte fiscalização, mais e melhores serviços, e também para que vítimas e famílias possam usar suas vozes e o poder das suas histórias para cobrar do governo que implemente suas promessas. O governo brasileiro fez uma série de compromissos com a Década pela Segurança Viária e para a segurança no trânsito em geral. No Brasil existem leis excelentes em vigor. É importante que as ONGs trabalhem para que essas leis sejam realmente cumpridas para que vidas sejam salvas”, disse.
Para Laura, as ONGs no Brasil têm bastante energia e entusiasmo e, nas suas capacidades individuais, têm feito extremamente bem o seu trabalho. “Estão fazendo o que é preciso: lutando pelos direitos dos pedestres, pelo melhor uso de espaços públicos, por dividir a rua e para garantir que as leis sejam integralmente implementadas e cumpridas. Isso é realmente maravilhoso de se ver”, afirmou.
Ela acrescenta que a OMS está disposta a apoiar o que vem sendo feito pelas ONGs em suas respectivas áreas e populações para fortalecer ainda mais o trabalho. “Se pudermos auxiliar as ONGs a melhorar na área de advocacy, acho que podemos fazer ainda mais progressos em cidades país afora”, ressaltou.
Laura destacou como exemplo a Youth for Road Safety (Yours), que trabalha no sentido de conscientizar os jovens – maiores vítimas no trânsito – a adotar comportamentos seguros e ser multiplicadores dessa consciência. A Yours desenvolveu um kit de ação para segurança viária, que apresenta a segurança no trânsito ao público jovem e oferece a organizações o conhecimento necessário para a implementação de projetos na área.
Laura lançou no encontro o guia para ONGs Promovendo a defesa da segurança viária e das vítimas de lesões causadas pelo trânsito e apresentou a Aliança Global de ONGs em Segurança no Trânsito, criada em 2011. Ela lembrou que dois anos antes, em maio de 2009, mais de 100 representantes de 70 ONGs de 40 países se reuniram em Bruxelas pela primeira vez num encontro promovido pela OMS. Os participantes compuseram uma Declaração com 33 recomendações para melhorar a segurança viária.
A Aliança já conta com 140 membros em 90 países, sendo duas representantes brasileiras: a Fundação Thiago de Moraes Gonzaga/Vida Urgente, e a Criança Segura. Os membros da Aliança Global encontram-se duas vezes por ano para a troca de informações e boas práticas, e a cada dois anos é realizado um evento global de ONGs. Em 2015, haverá um encontro para discutir o que as ONGs irão dizer na 2a Conferência Ministerial Mundial sobre Segurança no Trânsito.
No final do encontro na Opas em Brasília, os participantes de ONGs brasileiras acordaram pelo início de um processo de colaboração continuada como uma rede informal nos próximos anos e decidiram pela criação de um grupo no Facebook para o compartilhamento das suas respectivas atividades.
Baixe as apresentações do evento
Conheça as ONGs que participaram:
Instituto Paz no Trânsito (IPTRAN)
Fundação Thiago Gonzaga/Vida Urgente
Em Trânsito Consultoria (Blog do Biavati)
Associação Brasileira de Pedestres
Laboratório de Psicologia Ambiental/UnB
Global Road Safety Partnership - GRSP
Observatório Nacional de Segurança Viária - ONSV
Associação Piauiense de Educação no Trânsito - Apetrans
Associação Preventiva de Acidentes de Transito - Apatru
Associação Paraense de Motociclistas - Aspamoto