Fabricantes atestam que metade dos brasileiros que compram motocicletas pertence às emergentes classes D e E
Artigo publicado pelo Senado na revista « Em discussão », em número especial, com título « Explosão de motos e mortes » de Novembro 2012 (página 36).
Quase metade (48%) dos compradores de motocicletas está nas classes D e E, que correspondem a cerca de 35% da população brasileira. Se for acrescida a classe C, somam 85% dos consumidores do produto. É o que revela o diretor-executivo da Abraciclo, José Eduardo Gonçalves, que nos debates do Senado classificou a moto de “verdadeiro veículo popular em todos os seus aspectos”. Segundo Gonçalves, existem razões bem fortes que explicam a atração desses brasileiros pela motocicleta: baixo custo de aquisição e manutenção, economia de combustível e transporte rápido para qualquer localidade. Associadas a isso, a possibilidade de usar o veículo para gerar renda e a natural inclusão social que o transporte próprio traz às famílias.
De acordo com o Anuário Abraciclo 2012, citando dados do Censo de 2010, mais de um terço das pessoas ocupadas e que trabalham fora de seu domicílio gasta pelo menos meia hora para se deslocar para o trabalho. São mais de 7 milhões que consomem mais de uma hora em cada deslocamento. Em regiões que concentram maiores aglomerados metropolitanos, como o Sudeste, o percentual de pessoas que levam mais de meia hora para ir ao trabalho passa dos 40%.
A comparação entre o crescimento populacional e o da frota de veículos e de motos atesta que a expansão de venda de motocicletas veio no rastro do ingresso de milhões de famílias no mercado consumidor brasileiro. Em 2006, eram 186 milhões de habitantes para uma frota de 27 milhões de automóveis e quase 8 milhões de motos. Em 2011, eram 192 milhões de habitantes, 41,3 milhões de automóveis, 18 milhões de motocicletas.
Um a cada dois motoristas masculinos também está apto a dirigir motocicletas. Entre as mulheres, esta proporção cai para 25%. Os dados do Denatran a respeito dos habilitados para dirigir motocicletas mostram que esse público é formado por 21,3 milhões de pessoas — 17,3 milhões de homens e 4 milhões de mulheres. Mas esse amplo domínio masculino já foi maior. Em 2001, 83% dos habilitados eram homens, contra 75% em 2011, ano a que se referem todos os dados acima.
Depois de romper a barreira dos sexos, a escolha da moto como meio de transporte e/ou lazer pelos brasileiros começa a avançar também sobre as faixas etárias. A antiga associação do veículo aos jovens ainda é dominante (67% entre os homens e 82% entre as mulheres têm entre 18 e 40 anos), mas já é notável perceber que, dos portadores de habilitação categoria A, um terço dos homens e 19% das mulheres já são pelo menos quarentões.
Outro importante fenômeno que se registra no mercado consumidor das motocicletas é o seu avanço para o interior e sobre as regiões mais pobres (Norte e Nordeste). De acordo com a Abraciclo, deve-se destacar a grande eficácia que o veículo tem demonstrado como meio de transporte destinado aos mais variados pavimentos, circunstâncias e necessidades — em particular, para utilização profissional e em regiões menos favorecidas por estrutura adequada de transporte. “A evolução da comercialização nas regiões Norte e Nordeste é indicador indiscutível da descoberta da motocicleta como meio de transporte ideal: baixo custo de aquisição e despesas moderadas com manutenção”, diz o anuário da entidade.
A Abraciclo também traçou o perfil específico dos mototaxistas e motofretistas. A maior parte, 98,33%, são homens (ver infográfico acima) e cerca de 61% deles têm até dois anos de profissão, dado importante, conforme ressaltou José Eduardo Gonçalves, pois os anos de experiência são determinantes para os índices de acidentes. Quanto menor o tempo de habilitação, maiores os riscos sobre duas rodas.
Dos compradores, 16% afirmaram ter adquirido uma motocicleta para utilizá-la como instrumento de trabalho. Em relação à jornada, 58,8% trabalham de seis a oito horas por dia e 28,75%, de oito a dez horas. A maioria, 56,25% possui ensino médio completo.
Em São Paulo, a renda média é de R$ 2 mil, de acordo com o Sindimoto-SP. Os setores que mais empregam a categoria são os de alimentação delivery, entrega express, jornais, bancos, farmácias, hospitais e supermercados. Mas os salários e os regimes trabalhistas — e a informalidade — variam de acordo com a região. “Ganho R$ 1.580 por mês, mas apenas R$ 580 estão registrados na carteira de trabalho”, contou Orlando Bindá dos Santos, representante da União Estadual dos Mototaxistas do Estado do Amazonas.
O presidente do Sindicato das Empresas de Telesserviços e Entregas Rápidas do Rio Grande do Sul (Setser-RS), Luiz Carlos Mello, alertou para a existência de um motociclista que não é profissional, mas trabalha na área fazendo bico, sem o devido preparo e as garantias sociais. Ou o bico é feito pelo próprio profissional em horário alternativo àquele em que é contratado regularmente por uma empresa.
“O funcionário trabalha em horário comercial em nossas empresas e, após o expediente, vai prestar serviço a restaurantes e farmácias, que se beneficiam da nossa mão de obra, não assumem responsabilidades nem garantem direitos, oferecendo valores abaixo do mercado, pressionando o funcionário a correr para fazer entregas do produto quentinho. Essas empresas colocam em risco a vida e a saúde do entregador”, afirmou Mello.
Outra pungente evidência de que a moto é o veículo de escolha dos trabalhadores brasileiros está nas tristes estatísticas coletadas no estudo Mortos e Feridos sobre Duas Rodas: estudo sobre a acidentalidade e o motociclista em São Paulo, de Heloísa Martins e Eduardo Biavati. De 2005 a 2008, metade dos mortos concentrou-se em três grupos ocupacionais: trabalhadores dos serviços, vendedores do comércio em lojas e mercados (21,6%), trabalhadores da produção de bens, manutenção e reparação (19,9%) e trabalhadores de serviços administrativos (9,4%).“A notável constância da distribuição dos mortos nas mesmas categorias ocupacionais ao longo dos anos é reforçada, por outro lado, por um mesmo perfil na distribuição de escolaridade, dividida em partes iguais entre o ensino fundamental (34,7%) e o ensino médio (38,2%)”, relata o estudo.
“Apesar da escolaridade média, muitos desses jovens eram simples generalistas (como, por exemplo, os auxiliares de serviços gerais), ou ajudantes de funções mais técnicas e qualificadas (auxiliares administrativos e todas suas variantes) no mercado de trabalho. Para esses jovens, assim como para os motofretistas, a motocicleta era provavelmente muito mais do que meio de transporte para os deslocamentos casa—trabalho; ela era condição para o desempenho do trabalho”, conclui o estudo.
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