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Tesouros seguros no banco de trás

Instituída há quase dois anos, Lei que obriga o uso de dispositivos de retenção para crianças até sete anos e meio já começa a apresentar resultados positivos. Para Andreia Françoia, coordenadora nacional da ONG Criança Segura, a exigência deveria estender-se a crianças de até dez anos ou 36 quilos.

Marina Lemle

Férias escolares, viagens a vista. Para ter só lembranças boas, segurança em primeiro lugar: crianças no banco de trás, acomodadas nas cadeirinhas indicadas para suas idades.

A resolução 277 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) estipula que crianças com até um ano de idade utilizem, obrigatoriamente, o bebê conforto; crianças de um a quatro anos, cadeirinha; de quatro anos a sete anos e meio, assento de elevação; e de sete anos e meio a dez, cinto de segurança, conforme as ilustrações abaixo.

Cadeirinha Res 277 R1

Instituída em setembro de 2010, a obrigatoriedade do uso dos equipamentos de segurança já começa a apresentar resultados positivos. Estudo realizado pelo Núcleo de Estatísticas da Polícia Rodoviária Federal em maio de 2012 aponta uma queda significativa no número de mortes de crianças até sete anos depois que a Lei entrou em vigor.

Na faixa de 0 a 7 anos, houve uma redução de 33% no número de crianças mortas no período de janeiro a agosto de 2011 em comparação ao mesmo período de 2010 e de 31%, em relação ao mesmo período de 2009. No ano de 2011 inteiro foram 94 mortos, 26% a menos que em 2010 e 25% a menos que em 2009.

Entre 2007 e 2010, antes da Lei vigorar, houve uma taxa de aumento de mortos na faixa etária de 0 a 7 anos de 5,89% ao ano. Comparando 2011 com 2007, houve uma redução de 7% nas mortes. “Podemos concluir, portanto, que o uso da cadeirinha efetivamente salvou a vida de dezenas de crianças”, conclui a PRF.

Já na faixa de 8 a 12 anos, em que a cadeirinha não é obrigatória, houve aumento de 4% no número de mortos em 2011 em relação a 2010, e uma redução de 3% em relação a 2009.


Quantidade de mortos por faixa etária nas rodovias federais nos anos de 2009 a 2011
Faixa etária Jan-Ago/2009 Jan-Ago/2010 Jan-Ago/2011 Set-Dez/2009 Set-Dez/2010 Set-Dez/2011
0 a 7 anos (cadeirinha obrigatória) 88 91 61 37 36 33
8 a 12 72 58 66 28 35 31
Acima de 12 3886 4761 4982 2357 2664 2535
Não informado 608 621 615 265 358 340
Total geral 4654 5531 5724 2687 3093 2939
Fonte: Siger/DPRF, maio de 2012

Para a coordenadora nacional da ONG Criança Segura, Alessandra Françoia, a resolução é equivocada ao limitar a obrigatoriedade da cadeirinha aos sete anos e meio de idade.

"A criança nessa idade não tem tamanho para utilizar o cinto. Ela é pequena e mais frágil, seu corpo ainda está se desenvolvendo. Crianças com até os 36 quilos, peso aproximado crianças de dez anos, devem utilizar o assento de elevação. Só aquelas com mais de 36 kg e 1,45m de altura devem utilizar o cinto de segurança, que deve ser de três pontos”, afirma.

Alessandra explica que os equipamentos são testado pela massa e por isso deve-se usar o peso da criança como parâmetro: bebês até 13 kg no bebê conforto; crianças de 9 a 18 kg, na cadeirinha, e de 15 a 36 kg, no assento de elevação. Segundo ela, o uso correto dos equipamentos é a única forma segura de transporte de crianças em veículos e a sua instalação adequada também é fundamental para garantir a eficácia. “É importante seguir rigorosamente as instruções do manual”, recomenda.

Levantamento feito pelo Detran do Rio Grande do Sul também reforça a importância do uso das cadeirinhas. Um comparativo do período de 11 meses, de 1º de setembro de 2010 a 31 de julho de 2011, em relação ao mesmo período do ano anterior (1º de setembro de 2009 a 31 de julho de 2010), aponta uma redução de 31,8% no número de vítimas fatais de idades de 0 a 11 anos. Nos período anterior à lei, foram registradas 22 mortes nesta faixa etária, número que caiu para 15 nos 11 meses posteriores à exigência. Considerando-se todas as faixas etárias, o total de vítimas na condição de passageiros registrou no mesmo período redução de 3,4%.

Estatísticas da National Highway Traffic Administration sugerem que o uso das cadeirinhas pode reduzir em até 71% o risco de morte e em 69% o de hospitalização em caso de acidentes.

Contra a resistência, campanhas educativas

Apesar dos indicadores positivos, ainda há quem resista à lei da cadeirinha. Por isso, a ONG Criança Segura aproveita o período de férias, quando o movimento nas rodovias tende a aumentar, e consequentemente o risco de acidentes, para reforçar a Campanha pela Vida da Criança no Trânsito, uma parceria com a Associação Brasileira de Produtos Infantis (Abrapur).

Na campanha, histórias reais de famílias inspiram peças de comunicação para internet, rádio e 22 painéis em rodovias nas regiões Sudeste e Sul. Estão previstas 2 milhões de inserções em portais, sites e rádios. No site oficial, em www.usecadeirinha.com.br, é incentivada a postagem de depoimentos e fotos. Mais de 530 relatos de pessoas que já passaram por acidentes ou que não abrem mão do equipamento já estão no ar. A campanha também está no Twitter e no Facebook. “As pessoas estão mudando de hábito”, diz Alessandra, que trabalha com a causa há 11 anos.

Outra campanha pelo uso do dispositivo de retenção para crianças é veiculada pelo Inmetro, que certifica a qualidade dos produtos no mercado. O selo de identificação da conformidade do InMetro é obrigatório desde 2008. Nas férias de janeiro de 2012, a questão foi tema do primeiro vídeo da série "Faça Certo", na TV Inmetro, no YouTube. No vídeo, especialistas abordam a importância da utilização dos dispositivos certificados dentro dos padrões de segurança.

Brincadeiras com a cadeirinha em casa

E se já é complicado mudar padrões de comportamento nos adultos, que dirá da dificuldade de convencer as crianças, que ainda não entendem estatísticas e se sentem incomodadas com as amarras, ficando inquietas e buscando brechas para se libertar.

A ONG Criança Segura recomenda fazer paradas, principalmente em casos de viagens longas, e relacionar o equipamento a atividades prazerosas dentro de casa, como brincadeiras ao redor e com a cadeirinha. Segundo a ONG, a conscientização para que a criança aceite a cadeirinha deve começar bem cedo, explicando a ela a importância do dispositivo, mesmo que ainda não seja capaz de entender os riscos.

“O uso da cadeirinha deve fazer parte da educação da criança. É importante que seja uma prioridade para os pais e que seja utilizada sempre, sem exceção. Os pais devem interagir com a criança no momento da escolha e da compra do equipamento, trazer a cadeira para casa para brincar, associar à alimentação”, diz Alessandra.

A polêmica das pick ups

Outra crítica de Alessandra em relação à resolução, além do limite da obrigatoriedade do assento de elevação em sete anos e meio, é o fato de permitir a instalação da cadeirinha no banco da frente em caminhonetes de cabine simples (sem banco de trás), mesmo com o banco afastado ao máximo do painel e com o airbag desativado.

“A ONG não recomenda crianças na frente. Só por estar atrás, a segurança já aumenta, porque isso reduz a força do impacto em cerca de 30%”, explica.

Sobre a questão do airbag, Alessandra explica que é um equipamento feito para adultos e que pode acabar ferindo a criança num impacto. Segundo a especialista, em caso de carro com airbag lateral, deve-se colocar a cadeirinha no meio do banco de trás ou desativar o airbag.

Histórico da Lei

O transporte de crianças com menos de dez anos e o uso de cinto de segurança, previstos nos art. 64 e 65 da Lei 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro), foram regulamentados em 06 de fevereiro de 1998 através da Resolução 15 do Contran, determinando o transporte no banco traseiro, usando cinto de segurança ou sistema de retenção equivalente, sem especificações. Em 2008, o Contran detalhou as exigências na resolução nº 277, revogando a Resolução nº 15.

Mais informações:

Guia da Cadeirinha da ONG Criança Segura

Dicas de Prevenção – Carro – ONG Criança Segura

Apresentação de Alessandra Françoia (ONG Criança Segura), no Seminário Denatran de novembro de 2010

Procedimento de fiscalização - dispositivos de retenção para Crianças - Portaria Inmetro 38/2007

Dispositivo de retenção para crianças – vídeo da série Faça Certo, da TV InMetro, no YouTube

Avaliações de cadeirinhas e cintos do Insurance Institute for Highway Safety

Cadeirinhas de segurança para crianças - Situação nos países ibero-americanos e Caribe - Junho de 2012 – Pesquisa da Fundação Mapfre

palavras-chave: cadeirinha, segurança, proteção, criança